sexta-feira, 26 de julho de 2013

REDUÇÃO DA POBREZA

A redução da pobreza no Brasil entre 1970 e 2011, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A redução da pobreza no Brasil entre 1970 e 2011

[EcoDebate] A renomada pesquisadora Sonia Rocha, em texto publicado no XXV Fórum Nacional do BNDES, em maio de 2013, documentou o processo de redução da pobreza no Brasil entre 1970 e 2011. Utilizando uma linha de pobreza com base na estrutura de consumo dos anos 70 (ajustada monetariamente para levar em conta as mudanças de preços ao longo do período 1970-2011), a pesquisadora mostra que a pobreza no Brasil caiu de cerca de 70% em 1970 para 10% em 2011.
Na década de 1970, período de grande crescimento do PIB, quando ocorreram o “milagre econômico” e o “segundo PND”, a proporção de pobres no país caiu fortemente de 68,4% em 1970 para 35,3% em 1980. Porém esta redução da proporção de pobres foi muito desigual em termos regionais, pois São Paulo apresentou resultados excepcionais (já que a proporção de pobres no Estado em 1980 correspondeu a um terço daquela medida em 1970) mas no Nordeste e no Norte/Centro-Oeste, a evolução da pobreza foi bem menos favorável no período, levando ao agravamento da distribuição regional dos pobres brasileiros.
O período 1980-1993 marca a longa década perdida, indo do início da crise do modelo nacional-desenvolvimentista ao processo de abertura neoliberal do governo Collor e à implantação do Plano Real. Como diz Sonia Rocha: “No período caracterizado por oscilações da renda, sem avanços significativos, a queda da proporção de pobres ao ritmo médio de 1% a.a., não foi o pior resultado possível. Embora tenha sido uma violenta ruptura em relação à evolução do período anterior, apresentou uma componente espacial e distributiva relativamente favorável: frente à conjuntura econômica adversa, as áreas mais dinâmicas sofreram mais e as mais pobres foram menos afetadas, diminuindo a desigualdade regional da pobreza. É exemplar que a proporção de pobres no Nordeste tenha declinado de 56,5% em 1981, para 45,6% em 1993, enquanto no Estado de São Paulo, núcleo dinâmico da economia brasileira, a proporção de pobres tenha aumentado de 19,% para 22,6% no mesmo período”.
O período 1993-2003 foi marcado pela bem sucedida implantação do plano de estabilização e do processo de controle da inflação. A queda forte da pobreza associada ao controle da inflação já tinha ocorrido após o Plano Cruzado de 1986. De fato, a estabilidade de preços tem de a reduzir a pobreza. O Plano Real, possibilitou que a a proporção de pobres diminuísse de 30,3% em 1993 para 20,6% em 1995 e ficasse mais ou menos constante ou apresentasse até uma certa elevação depois da desvalorização cambial de 1999.
O período 2003-2011, a despeito de alguns anos de crise, foi marcado pela retomada do crescimento econômico, pela valorização cambial e pela mudança nos termos de troca do comércio internacional, com a valorização do preço das commodities exportadas pelo Brasil. Além disto, o aumento da geração de emprego no mercado de trabalho, a valorização do salário mínimo e expansão dos programas de transferências assistenciais contribuíram para aumentar a renda das famílias brasileiras em geral e beneficiar preponderantemente as mais pobres. Desta forma, entre 2003 e 2011, a proporção de pobres caiu praticamente à metade, de 22,6% em 2003 para 10,1% em 2011.
A pesquisadora destaca que a redução sustentada da pobreza no período, têm como pano de fundo a continuidade da melhoria dos indicadores sociais (redução da mortalidade infantil, melhoria dos níveis educacionais, mais acesso à rede de água e esgoto e ampliação da posse de bens duráveis), que se observa sem interrupção desde 1970. Na primeira década do século XXI houve redução da desigualdade pessoal da renda e das desigualdades regionais, sendo que a região Centro-Oeste apresenta os menores níveis de pobreza.
Uma análise completa pode acessada no texto da bibliografia abaixo. Mas para não estender, segue abaixo os três pontos conclusivos apresentados por Sonia Rocha:
Primeiro, apesar do mecanismo de política estar bem desenhado como mostram os resultados da simulação, o objetivo de acabar com a pobreza extrema apresenta desafios da mesma natureza do que os de acabar com a pobreza, embora naturalmente demandando recursos mais modestos. Seria necessário que as transferências estivessem perfeitamente focalizadas nas famílias extremamente pobres. No entanto, além de difícil localizar a totalidade destas famílias, suas rendas oscilam para mais e para menos com muita frequência. Aliás, é por essa razão que o contingente de famílias que se qualificam para o BF continua se expandindo apesar comportamento favorável da renda.
Segundo, a eliminação da pobreza extrema via transferência de renda, mesmo privilegiando as crianças, não esgota as necessidades voltadas para atendê-las em outras dimensões. Além da renda familiar, ou até mais do que dela, emancipar as crianças pobres da pobreza depende de assisti-las de forma integrada e continuada, da infância a idade adulta, isto é, até a sua inserção produtiva. A cobertura universal da clientela do Bolsa-Família por creches e escolas de qualidade e em tempo integral é o ponto de partida e se configura hoje – por razões não só financeiras, mas também organizacionais – como o calcanhar de Aquiles da política antipobreza no Brasil.
Finalmente, a queda do ritmo de crescimento econômico em 2011 e 2012 não levou à reversão dos ganhos de renda das famílias e da sua distribuição, que permitiram a trajetória favorável da pobreza desde 2003. No entanto, sem retomada do crescimento para os patamares de 4 a 5% ao ano, as perspectivas tornam-se menos auspiciosas, especialmente diante das dificuldades para aumentar a taxa de investimento privado e público. Nesse sentido, a retomada de controle sobre as variáveis macroeconômicas é essencial para garantir a continuidade das conquistas dos últimos anos na área social”.
O Brasil tem uma oportunidade histórica para erradicar a extrema pobreza. Mas como a “Copa das Mobilizações” deixou claro nas ruas, o país precisa avançar em políticas universalistas de educação, saúde, transporte público, etc., pois a pobreza não pode ser vista apenas como ausência de renda e consumo, mas principalmente como ausência dos direitos de cidadania e da falta de respeito à qualidade dos serviços públicos.
Referência:
ROCHA, Sonia. Pobreza no Brasil – A Evolução de Longo Prazo (1970-2011). XXV Fórum Nacional – BNDES. Rio de Janeiro, 13-16 de maio de 2013. Disponível em:http://www.forumnacional.org.br/trf_arq.php?cod=EP04920

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 26/07/2013

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