segunda-feira, 2 de outubro de 2017

O QUE É A CATALUNHA E O QUE QUEREM OS CATALÕES

Apesar da pressão política do governo espanhol, da proibição da Justiça e da repressão da polícia, o governo da Catalunha manteve a decisão de realizar neste domingo (1º) um plebiscito sobre a independência da região que é a segunda mais importante economicamente na Espanha. Mais de 2.300 locais de votação foram preparados pelas autoridades locais, desafiando a proibição da mais alta instância do Judiciário do país.

É esperada a participação de mais de 5 milhões de eleitores, apesar da ordem judicial para que a polícia feche os locais  onde as urnas serão instaladas. Autoridades políticas catalães apelaram à Comissão Europeia, órgão Executivo da União Europeia, para ter assegurado o direito de a população votar. Peritos das Nações Unidas se declararam preocupados com a disputa em torno do plebiscito na Catalunha e pediram que as partes “evitem atos violentos de qualquer tipo”.

O separatismo não é tolerado pela Constituição da Espanha, nem pelas regras da União Europeia. Ainda assim, os catalães prometem permanecer firmes no intento, buscando respeito do governo central e reconhecimento internacional.

A evolução histórica da demanda catalã

O Império Espanhol nasceu em 1492 e a Catalunha viveu durante toda a Idade Média uma relação que alternou integração e resistência à monarquia, até a chamada queda de Barcelona, capital da região catalã, em 1714. Já no século 20, nos anos 1930, a Catalunha havia reconquistado relativa autonomia política dentro da Espanha. Porém, em 1936, o general Francisco Franco deu um golpe militar e, após três anos de guerra civil, implantou uma ditadura que durou 39 anos, até 1975.

Nesse período, Franco proibiu o idioma catalão e centralizou o poder político em Madri, sufocando à força qualquer plano autonomista dos catalães. A redemocratização, no fim dos anos 1970, fez reviver o modelo chamado “Generalitat”, previsto na nova Constituição, de 1978, que conferia novamente relativa autonomia administrativa à região. Desde então, o partido CiU (Convergência e União) foi o que teve maior protagonismo político ao longo dos anos.

A evolução histórica da demanda catalã O atual presidente da Catalunha é Carles Puigdemont, do CiU. Apesar da forte identidade catalã, a sigla manteve boa relação com o governo central, sem radicalizar o discurso independentista, pelo menos até 2006. Naquele ano, os catalães realizaram um referendo para aprovar uma lei que ampliava a autonomia da região em relação às previsões da Constituição de 1978. A nova lei falava da Catalunha como uma “nação” dentro da Espanha.



Foi nessa época também que a Justiça espanhola começou a colocar limites mais claros em relação aos planos de independência dos catalães. O novo Estatuto foi retaliado pelo Tribunal Constitucional – equivalente ao Supremo no Brasil – e o uso da palavra “nação” foi censurado nesse contexto.

O anseio independentista catalão cresceu ainda mais em 2010, quando a Espanha viveu uma grave crise econômica. Desde então, cresceram os protestos de rua, especialmente nos dias 11 de setembro de cada ano, quando é celebrado o Dia da Catalunha, que relembra a queda de Barcelona, em 1714. O discurso de que a região levava a economia da Espanha nas costas ganhou força. “Produzimos recursos e riqueza suficientes para vivermos melhor do que vivemos”, disse o então presidente da Catalunha, Artur Mas. “Não existe batalha mais urgente do que a soberania fiscal de nosso país”, afirmou, referindo-se à Catalunha como “país”. Em novembro 2014, foi realizado novo referendo.

Para driblar a Justiça, os organizadores usaram voluntários no processo, apresentaram a votação como uma iniciativa da sociedade civil e usaram o nome “processo participativo”, em vez de votação, plebiscito ou referendo. Mais de 80% dos catalães que votaram foram a favor da independência à época, mas a iniciativa, boicotada por partidos locais que se recusavam a radicalizar a pauta, teve o comparecimento de apenas metade dos eleitores da região.

O plebiscito deste domingo (1º) foi aprovado por uma lei local de 7 de setembro. Pesquisas encomendadas pelo próprio governo catalão mostram que 49% dos habitantes da região são contra a separação e 41% são a favor. Pesquisa do jornal espanhol El País mostra que 61% dos catalães consideram que esse plebiscito de agora não tem valor legal, mas 82% deles consideram que os governos regional e central deveriam entrar em acordo e promover um referendo que tivesse validade legal no futuro.

Qual o nível de autonomia atual

A Espanha tem 17 unidades territoriais. Destas, quatro têm status especial: Catalunha, País Basco, Andaluzia e Galícia, sobre as quais o governo central reconhece a existência de uma “nacionalidade histórica”. A Catalunha tem um governo regional próprio chamado Generalitat, além de uma bandeira e uma língua própria, falada pela maioria das pessoas que vivem dentro do território catalão. A Generalitat tem um presidente regional e um parlamento próprio, com poderes restritos à região – da mesma forma que as Assembleias Legislativas dos estados brasileiros.

A região também tem um corpo policial próprio – mas não tem Forças Armadas –, além de um corpo de bombeiro próprio, assim como acontece também no modelo brasileiro de segurança pública.

Os números da disputa

A Catalunha tem 7,5 milhões de habitantes, o que representa 12% da população espanhola. A região é chamada de “motor da economia espanhola”, pois responde por 19% do PIB da Espanha – unidade que mede toda a riqueza produzida num país, e fica na frente, inclusive, da capital, Madri, que responde por 18,9% do PIB espanhol. A região responde por 25% de todas as exportações do país e atrai 14% dos investimentos estrangeiros, além de produzir 19% dos automóveis e de liderar o ranking dos maiores destinos turísticos da Espanha, especialmente na capital da Catalunha, Barcelona.

É difícil prever as consequências da realização de um plebiscito que, apesar de ter sido declarado ilegal, pode mobilizar mais de 5 milhões de pessoas, em desafio ao governo central. O próprio resultado pode ser ignorado pelo governo espanhol, mas, mesmo que isso aconteça, alimentará um sentimento de frustração e de animosidade que, ao longo dos anos, tem colaborado para embalar ainda mais o movimento separatista.

Fonte: Geografia News

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